Estamos de volta nesta semana para mais uma transcrição com texto em nosso site. Desta vez, apresento uma transcrição da música Jerry Was a Race Car Driver, da banda Primus, com o excepcional Les Claypool no contrabaixo.
Claypool é um dos músicos mais renomados do cenário atual, dispensando qualquer tipo de apresentação. Com uma carreira impecável tanto no Primus quanto nas inúmeras bandas das quais foi integrante ou colaborador, além de sua carreira solo, ele exibe uma impressionante versatilidade técnica. Entre as diversas técnicas que domina, estão o slap, abafados, two hands, strumming e improvisações com escalas exóticas e simétricas, todas aplicadas com maestria. A música Jerry Was a Race Car Driver é uma excelente demonstração de seu talento.
Este artigo faz parte da minha coleção, que inclui diversos estudos sobre contrabaixo, teoria e análise musical.
Primus é uma banda americana formada em 1984, liderada pelo baixista Les Claypool. Conhecida por seu estilo único, que mistura rock alternativo, funk, e uma grande variedade de influências experimentais, a banda se destaca pelo uso inovador do contrabaixo e pelas composições excêntricas. Claypool, o principal compositor, é a alma do grupo, criando linhas de baixo complexas e muitas vezes fora do padrão, o que fez com que Primus se tornasse uma referência no cenário musical alternativo.
Na introdução da música, o baixista utiliza a técnica Two Hands. Com a mão direita, ele executa trítonos (C/Gb e D/Ab), enquanto a mão esquerda toca uma frase utilizando a escala de Ab maior. Este trecho é repetido ao longo da base de voz, com pequenas variações feitas por Claypool para gerar efeitos interessantes.
No refrão da música, o baixista mantém a mesma ideia, ainda utilizando Two Hands, mas com uma leve variação na frase, mantendo os mesmos elementos da introdução. É possível perceber um slide no último tempo do compasso.
No interlúdio, a técnica usada é o Slap. Vale destacar que a frase executada na corda Mi tem a mesma estrutura da frase tocada na mão esquerda nos exemplos anteriores, porém executada meio tom abaixo. A frase é finalizada com um strumming com intervalos de quarta.
A forma da canção é a seguinte:
Introdução: até o compasso 10
Base de voz: do compasso 11 ao 18
Refrão: do compasso 19 ao 27
Interlúdio: do compasso 28 ao 36
Base do solo (igual à base de voz): do compasso 37 ao 42
Refrão: do compasso 43 ao 50
Base de voz: do compasso 51 ao 54
Interlúdio: do compasso 55 até o final da canção
Embora esta canção tenha apenas três partes, elas são extremamente elaboradas e de difícil execução. O estudante precisará de bastante prática e domínio das técnicas de Slap, Two Hands e Strumming para tocar essa música corretamente.
Estude com calma, utilize o metrônomo e depois trabalhe para capturar o swing característico de Les Claypool.
Para mais informações, entre em contato pelo e-mail: femtavares@gmail.com
Em 2017, lancei um CD com o Apostrophe' Trio e disponibilizarei as transcrições aqui neste site ao longo deste ano.
Nesta semana, temos a transcrição da música Corações da noite.
É possível ouvir o álbum no Spotify, no YouTube ou em outras plataformas de streaming.
Youtube:
Corações da Noite
Nesta semana, temos a transcrição da música "Corações da Noite" do álbum Apostrophe' Trio de 2017.
A composição desta música segue uma forma estrutural composta por quatro partes distintas: Intro-A-Intro-B-C-D = solo de baixo-A-Intro-B-C-C-B.
A introdução da música foi construída com os acordes D9, E9, A7 e A#º. Os mesmos baixos desses acordes são utilizados para construir a parte A da música, mas essa parte, conta com dois acordes paralelos (Ebmaj7 e Dmaj7) - grifamos Gm e D por causa de questões tonais -. Para construir a linha do baixo, busquei resolver nas notas D e A para os primeiros dois compassos. Nos compassos 7~8, as notas-alvo foram Bb e D, nos compassos 9~10, as notas-alvo foram E e A e, por fim, as notas A e D, foram os alvos nos compassos 11~13.
Na parte B, temos um acorde pedal, o Bm, sobre o qual a guitarra desce com o baixo tocando as notas B, A, G# e G. Para a linha do baixo, aplico movimentos adicionais visando mudar a direção da progressão.
Na parte C, o contrabaixo foi escrito após a composição da harmonia. Ele, basicamente dedilha os acordes desta parte. O tom do início é Sol maior e são utilizados os acordes de G, D/F#, Em, Am e Bm7, sendo que o último acorde deste trecho (A/C#) inicia um processo modulatório que chegará em Cm7 no compasso 30.
Por fim, a base para o solo é estabelecida na tonalidade de Ré maior, com os acordes de Gmaj7, Bm7, Gmaj7 e Dmaj7. Durante o improviso, adoto uma abordagem por acorde, empregando o modo Lídio nos acordes maiores e o modo Dórico no acorde de Bm7, para conferir um caráter mais fusion. Alternativamente, utilizar apenas a escala de Ré maior também é uma opção eficaz.
Transcrição
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Apostrophe' Trio: Coraç
Música por Fernando Tavares
Performance: Fernando Tavares: Contrabaixo Lucas Barbosa Fragiacomo: Guitarra Thiago Sonho: Bateria
Gravado, mixado e masterizado por Armando Leite no Estúdio Tecnoarte! Produzido por Fernando Tavares
Vídeo
Aqui temos uma performance do trio executando a música no estúdio Family Mob.
Em 2017, lancei um CD com o Apostrophe' Trio e disponibilizarei as transcrições aqui neste site ao longo deste ano.
Neste mês, temos a transcrição da música Apostrophe' lançada no álbum homônimo de 2017.
É possível ouvir o álbum no Spotify, no YouTube ou em outras plataformas de streaming.
Youtube:
Apostrophe'
A primeira transcrição é da música "Apostrophe'", que nomeia o álbum do Apostrophe' Trio e o abre.
A composição desta música segue uma forma estrutural composta por quatro partes distintas: A-B-A'-C-D = solos-A-B-C-B.
Na seção A, os compassos 7 a 8 apresentam a base fundamental da música. Esta base é construída pela escala de Mi menor natural, com a blue note #4 (A#) e um cromatismo com a sétima maior (D#). Os compassos 1 a 2 exibem a melodia do baixo, criada utilizando as tríades correspondentes a cada nota presente na base dos compassos 7 a 8. Os acordes empregados compreendem: Em, F#º, Em/G, Am, Bb, B, juntamente com o cromatismo.
Na seção B, eu escrevi um trecho utilizando o campo harmônico de Mi DomDim, construindo a linha do contrabaixo a partir dos baixos E-D-F-E. Todas as notas utilizadas estão dentro da escala de Mi DomDim.
Na seção C, duas bases distintas são introduzidas: a primeira é constituída pelos acordes de A (I), E (V) e D (IV). As frases foram elaboradas a partir da escala de Lá maior. Já a segunda base é construída utilizando a escala de Si menor.
Por fim, a base para o solo é composta com a tonalidade de Lá maior, e optei pelos acordes de Bm/D, C#m e E. Para dar um caráter mais fusion, utilizei a escala de Ré Lídio para improvisar, dado que possuo várias frases previamente estudadas nesse modelo. É possível explorar outras opções de frases, como a Pentatônica de C#m, que se ajusta muito bem. Para aqueles que dominam frases no modo Dórico, é viável empregá-las em Si menor, gerando um efeito sonoro igualmente satisfatório.
Transcrição
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Apostrophe' Trio: Apostrophe'
Música por Fernando Tavares
Performance: Fernando Tavares: Contrabaixo Lucas Barbosa Fragiacomo: Guitarra Thiago Sonho: Bateria
Gravado, mixado e masterizado por Armando Leite no Estúdio Tecnoarte! Produzido por Fernando Tavares
Nesta semana temos mais uma coluna Artigos & Resenhas do nosso amigo Luiz Domingues. A nossa ideia com esta coluna é sempre deixar em evidência trabalhos de bandas autorais que estão fora do mainstream. Leiam o texto do Luiz, mas não deixem de fazer o mais importante que é curtir o som da banda apresentada aqui.
Dessa vez o sensacional Luiz nos fala sobre o EP "Subterrâneos" da banda Os Subterrâneos.
A matéria original pode ser encontrada neste link.
Sou músico e escrevo matérias para diversos Blogs. Aqui neste Blog particular, reúno minha produção geral e divulgo minhas atividades musicais. Como músico, iniciei minha carreira em 1976, tendo tocado em diversas bandas. Atualmente, estou atuando com Os Kurandeiros.
Sem mais, vamos ao texto do Luiz:
Os Subterrâneos / EP Subterrâneos - Por Luiz Domingues
É inacreditável, eu sei, mas em pleno 2017, com quase todo mundo a destilar lamúrias pelas redes sociais, em tom de crítica pela anti música que ocupa o mainstream (e na contrapartida não haver espaço algum para artistas do underground), nos confins da zona leste de São Paulo, uma turma jovem, ultra dinâmica e entusiasmada, vai nadando contra a maré do baixo astral generalizado e alheia ao “mimimi” dos perdedores (e por quê não, dos perdidos, também...), está a produzir uma música profundamente influenciada pelos anos 1960, resgatando inúmeros aspectos revolucionários daquela década memorável. É uma turma boa que produz shows; festivais, não quer nem saber de crise e sem “frescuras”, produz seu agito contracultural onde houver espaço, e nem importa-se se não tem infraestrutura adequada, por que se não houver, eles mobilizam-se e fazem acontecer. Só por tal mentalidade, já merecem todo o enaltecimento, mas não fica só nessa boa vontade extrema, pois trata-se de um celeiro de artistas talentosos, que tem o que dizer, portanto, agregue-se tal valor. E entre esses rapazes obstinados, muitos tem duas, três ou mais bandas mantidas em simultaneidade, e todos os amigos dessa fraternidade interagem, nem que seja em participações uns nos discos dos outros.
Hoje, quero tratar de mais uma banda dessa cena (já abordei o Capitão Bourbon, anteriormente), chamada “Os Subterrâneos”. Banda profundamente influenciada por bandas de garagem dos anos sessenta, não necessariamente famosas e daí, realça-se a extrema originalidade dessa banda em buscar sonoridades perdidas no tempo e no espaço, sendo que em realidade, tal estética jamais poderia ter sido obscurecida, nem mesmo pela ação do tempo. Contudo, muita coisa aconteceu na história do Rock e até o vilipêndio usado como arma / ação de marketing, tratou de obscurecer tal corrente histórica e agora, uma banda como Os Subterrâneos está fazendo o trabalho arqueológico e ao mesmo tempo mágico em reatar o fio da meada perdido, ou seja, o “religare” no Rock, um fato que Rockers genuínos aos quais incluo-me, sonham em ver acontecer, há décadas.
Os Subterrâneos tem em sua formação como quarteto, os seguintes membros : Eduardo Osmedio (Guitarra / Voz); Ronnie Pedroso (Órgão / Gaita / Guitarra e Voz); Guilherme Torquato (Baixo) e Rogério Antônio (Bateria e Voz). Seu EP, chamado “Subterrâneos”, foi lançado em 2017, contendo quatro faixas. A sonoridade da banda, em termos de áudio, soa bastante rústica, parecendo de fato um bootleg concebido em poucos canais, sob a égide do mundo antigo das gravações (leia-se analógico), e isso é sensacional enquanto fidedignidade às influências que eles seguem, com dedicação. Até a foto da banda na capa do álbum, com os rapazes trajados como se estivessem em 1966, em meio ao “fog” de Londres, é incrível. E fica ainda mais interessante se levarmos em conta que são paulistanos da zona leste e que estão fazendo isso em 2017...
Sobre as quatro faixas, ouvi-las no headphone é um mergulho direto aos “sixties”, uma viagem no Túnel do Tempo, quiçá na companhia de Anthony Newman e Douglas Phillips, absorto em cambalhotas num Kaleidoscópio psicodélico e muito louco.
A primeira faixa, “Ruas de Soweto”, tem um som de órgão hipnótico. É aquele timbre agudo e maravilhoso desses teclados tipicamente sessentistas como os órgãos Voz e Farfisa, inigualáveis pela suas respectivas características no tocante aos timbres. Gostei muito dos backing vocals ao fundo, quase sombrios, repetindo frases proferidas pela voz principal e lembrando muito diversos artistas egressos da Jovem Guarda e estes por sua vez, que beberam forte no Pop francês e italiano, principalmente, naquela década. Muito boa uma parte desdobrada em compasso 3/4, insinuando uma valsa lisérgica. Gostei também do solo de guitarra e o timbre do baixo, quase sem sustain, com aquele timbre anasalado, também muito usado naquela época.
“Borboleta Branca” é a segunda canção e apresenta-se com forte orientação do Acid Rock sessentista. Nessa faixa, um músico convidado tocou guitarra, Jun Santos. A letra investe forte na loucura psicodélica, buscando imagens surreais. Eis um trecho :
"Era uma borboleta voando mais branca que a neve
sobrevoava o jardim colorido a procura das tulipas negras"...
A terceira faixa, “Dia Lindo”, tem em sua parte inicial uma divisão rítmica fragmentada, sob compasso 2/4, muito interessante. Convenções duras ocorrem em diversos trechos trazendo um peso incrível. Tem muito do som da pouco conhecida banda sessentista americana, “The Music Machine” (aliás, uma influência confessa dos rapazes). Gostei do solo de guitarra executado pelo artista convidado, Uly Nogueira, outro músico com forte participação nessa cena, tocando em várias bandas irmãs e também produzindo e ofertando apoio como ilustrador de capas de discos e cartazes de shows a evocar a psicodelia sessentista, sendo um talento impressionante. E não obstante ser um baterista ótimo em outras bandas, aqui contribuiu com um belo solo de guitarra ao pisar no “Fuzz”, sem parcimônia.
“Jardim Psicodélico” fecha o EP e não pude deixar de enxergar o “Iron Butterfly” a flutuar fortemente como influência ótima para os rapazes. Trata-se de uma viagem psicodélica, uma autêntica good trip. Ouvir essa faixa de olhos fechados pode levá-lo diretamente aos bastidores do Auditório Fillmore West, em algum momento de 1967, quando em meio a tal epifania, a vontade de não voltar para a realidade do século XXI em curso, será imensa, tenha essa certeza. Gostei muito da condução da bateria, evoluindo com bastante criatividade nos tambores, e também do solo de guitarra, muito bonito. A letra investiu forte no surrealismo explícito, na melhor tradição dos ditos, lindos sonhos delirantes.
"acordei, mas ainda estava a sonhar
encontrei o jardim psicodélico dos sonhos meus"...
O disco foi gravado no estúdio “Corações de Pedra”, em São Paulo. Jonas Morbach foi o técnico da captura de gravação e mixagem / masterização. Foto e arte da capa a cargo de Fernanda Heitzman (um trabalho muito bom da parte dela, por sinal).
Em postagens que vejo pelas Redes Sociais a anunciar seus shows, percebo que gostam de brincar com o fato de que são da zona leste de São Paulo, referindo-se a ela como “Zona Lost”, numa alusão ao seriado de TV que fez sucesso, anos atrás. Mas creio que esses artistas na verdade não perderam nada, mas ao contrário, estão achando um caminho muito interessante a resgatar raízes remotas do Rock, ou seja, fazem um trabalho notável.
Recomendo o bom trabalho dos Subterrâneos, tanto acompanhando-os ao vivo aonde quer que estejam, quanto pela audição de seu EP, aqui analisado. E que venham mais trabalhos nessas características. Viva a psicodelia sessentista !
Ouça o EP, abaixo :
Escute o álbum na íntegra, através da sua postagem de You Tube:
Estamos de volta com mais uma coluna Artigos e Resenhas aqui no nosso site. Dessa vez o sensacional Luiz Domingues nos fala sobre o álbum "Que seja infinito enquanto vivo" da banda Klatu.
A matéria original pode ser encontrada neste link.
Sou músico e escrevo matérias para diversos Blogs. Aqui neste Blog particular, reúno minha produção geral e divulgo minhas atividades musicais. Como músico, iniciei minha carreira em 1976, tendo tocado em diversas bandas. Atualmente, estou atuando com Os Kurandeiros.
Sem mais, vamos ao texto do Luiz:
Que Seja Infinito Enquanto Vivo / Klatu - Por Luiz Domingues
O Klatu é uma banda de muitos predicados, isso é inegável. Já tive a oportunidade de elencar suas qualidades artísticas, em matéria escrita tempos atrás neste meu Blog 1, quando estabeleci uma resenha "mezzo" biográfica dessa banda, falando de seus discos até então lançados (“Em Busca do Rock Infinito”, de 2008 e “Um Pouco Mais Desse Infinito”, de 2013”), além de sua trajetória em torno desse conceito contínuo do mote sobre o “infinito”. Pois agora, 2017, o Klatu lança o terceiro álbum e fecha a sua trilogia temática, mostrando-nos “Que Seja Infinito Enquanto Vivo”. Antes de avançar na resenha cabe ressaltar que não trata-se de um álbum ao vivo, como talvez o leitor possa ser sugestionado a deduzir pelo seu título. É “vivo” no sentido do antônimo de “morto”, embora no âmago da obra, a ideia seja fazer a opção pelo meio termo entre as duas condições, falando do dito zumbi, o “morto-vivo”. Contudo, não em sentido fantasmagórico, evocando a literatura clássica do terror, mas usando e abusando da metáfora do zumbi no intuito de criticar os rumos atuais da sociedade moderna e suas múltiplas formas de condicionamento e manipulação da parte das ditas “forças ocultas”, que aliás, nem tão ocultas o são na atualidade.
Para início de conversa, o Klatu assume que esse seu terceiro disco é uma “Opera Rock”, fechada num tema único e com suas canções seguindo o libreto de uma história. Não é para qualquer um aventurar-se num conceito mais ambicioso desse porte, mas o Klatu amadureceu muito, e banca-se nessa ousada iniciativa, pelo que ouvi e li no decorrer do novo disco. E para provar o que digo, já menciono um dado criativo ao extremo em se considerando tratar-se de uma obra temática : apesar dessa estrutura, o Klatu quebra o protocolo e no libreto, não há personagens estabelecidos. Trata-se da história de um homem, e a pergunta é inevitável : que homem ? Pois é, uma espécie de “alma mater” onde cada ouvinte / leitor pode identificar-se a vontade e até vestir sua armadura ou carapuça, como queira. Essa representação da humanidade canta o que sente e vê, e nesse aspecto, o que enxerga é sombrio, falando de uma sociedade que oprime e esmaga as individualidades; desdenha dos sonhos, e oferta apenas o pesadelo como opção concreta. Para sair dessa, só morrendo ou tendo um absoluto lampejo de loucura e arrojo ao romper com tudo. O cerne da questão é esse, a extrema manipulação e entenda o óbvio, ou seja, a massificação bovina a serviço de uns poucos interessados em que a sociedade permaneça nesse estado de coisas. O clamor em si não é uma novidade, mas a maneira artística pela qual o Klatu expôs tal conceito, aí sim, é bastante criativo. Nada é mais significativo para ilustrar o filme de zumbis em que vivemos no cotidiano, do que verificarmos pessoas nas ruas, absortas pela ação hipnótica de seus “smartphones” e é por aí que o Klatu critica fortemente a ação dos marqueteiros; “formadores de opinião”, governos e mídia, e nessa lógica, parece que a internet, que na prática deveria ser livre, acaba por tornar-se mais uma arma de manipulação sórdida. A quem devo apoiar agora ? Vou bater minha panelinha na varanda gourmet do meu apartamento a favor de A ou B ? Tanto faz, pois você já "dançou" só por ter obedecido a ordem para ser um "percussionista útil", digamos assim...
O núcleo ativo do Klatu : Leco Peres & Carol Arantes
Sobre a obra em si, o amadurecimento do Klatu também mostra-se concreto. O dois discos anteriores são ótimos, mas neste terceiro, é nítida a firmeza adquirida, com o benefício da experiência acumulada. Agora assumido como um duo, através do casal Leco Peres (baixo; voz e percussão), e Carol Arantes (voz e percussão), o Klatu recrutou músicos de apoio de alto nível e o resultado sonoro impressiona pela qualidade. Todas as faixas tem um apontamento sobre o desencadeamento da história contada, mas é muito sutil, a expressar um sentimento, tão somente.
Na primeira faixa, o conceito do “espaço / tempo” , anuncia a canção denominada “Sobrevivendo”. Tema instrumental e curto, tem a função clara de ser uma “Overture”, típico recurso da tradição das óperas convencionais, e também usado em diversas “Óperas-Rock” famosas nos anos 1960 / 1970 (“Tommy”; “Quadrophenia”; “Victoria”; “Jesus Christ Superstar” etc). Com uma intervenção forte de bateria em ritmo tribal e teclados com timbres modernos, lembra algo Techno com remota raiz no “Krautrock” dos anos setenta. A destacar-se, um riff forte de orientação Hard Rock e um solo de guitarra sucinto, mas de arrepiar.
“A ameaça” claramente denota o personagem em momento de alerta ao deparar-se com a realidade perigosa em que cerca-se. A canção chama-se “Terra de Zumbi” e claro, a alusão dá-se pelos milhões de seres controlados pelas corporações que norteiam a sociedade massacrante e trata-nos como meros códigos de barras ambulantes e “consumidores” de alguma coisa, para o benefício deles, exclusivamente. Com clima de balada, lembra o Pink Floyd em alguns aspectos. Gosto das delicadas tessituras harmônicas realizadas pelas guitarras e com detalhes bem bacanas, entre os quais o uso de caixa Leslie, sempre agradabilíssima. Gostei muito de um riff mais pesado, lembrando bastante a maneira pela qual o Jethro Tull expressava volúpia ao passar da docilidade Folk para o Hard Rock. Acho que o Klatu acertou nessa transição também.
Na letra, Carol escreveu versos fortes. Destaco:
“Marionetes, manipulados,
sorrisos falsos, desesperados,
morrendo todos os dias sem perceber”...
Chega a terceira canção e o momento da história é o da “epifania”. Hora de sonhar livremente e assim, a canção “Livre Sonho Deszumbizante” é quase uma súplica, de quem tomou consciência do massacre externo e clama por liberdade. Impossível não notar que exista uma intenção em estabelecer um acróstico nesse título e isso remete aos anos sessenta em múltiplos exemplos (“Lucy in the Sky With Diamonds”; “Lindo Sonho Delirante” etc), portanto, drogas a parte, saudade do tempo em que muita gente mostrava-se interessada em empreender esforços em prol do dito “Open Mind / Mind Expansion” e no caso, o personagem tem essa epifania atualmente, ou seja numa época muitíssimo mais hostil e fechada para tais ideais. A canção é boa, tem um swing meio “sixties” no formato da sua parte A, embora predominem timbres modernos e não haja a preocupação de soar “retrô” deliberadamente. O final da música tem uma clara influência do Rock Progressivo setentista, e ouso dizer, reveste-se de uma aura do Gentle Giant. Ao cantar:
"Esse sonho é um pouco mais que real
e o caminho é interdimensional
retomar aquele velho ideal
do acorde gravitacional”, traduz bem a epifania proposta.
Na quarta faixa, uma crítica interessante. Sabe aquele sujeito bem intencionado, mas que no fundo está tão equivocado quanto o ardiloso que sabe o que está fazendo ? Pois é, tem muita gente nessa condição, nadando a favor da maré imposta, todavia, achando que tem senso crítico e consciência; independência de ideias etc e tal, mas na verdade está na vala comum dos manipuláveis, aquele tipo de ser humano “bonzinho” que vai às ruas para clamar pela moralidade na política, mas usando uma camiseta com o distintivo de uma das instituições mais corruptas do planeta, porém, lógico, é um inocente e nem sabe disso na prática... na letra, isso é explícito:
"e de repente eu me deparo
um coletivo muito legal
parecem certos, inteligentes
são os melhores para nos salvar”...
Nessa canção, chamada “Volta à Terceira Dimensão”, a ideia lançada é a do “conflito”, ou seja, o choque do personagem após a epifania da faixa anterior, ao deparar-se com a dura realidade telúrica. Mais uma vez senti influência forte do Krautrock setentista logo no início, e doses maciças de Rock Progressivo, novamente evocando o Gentle Giant e o Jethro Tull. São partes mais pesadas, com um pé no Hard Rock. Parecem aqueles interlúdios mais vigorosos dentro de obras como “Three Friends” e “Thick as a Brick”. E tem também uma menção ao Jazz, com o baixo fazendo um andante clássico do gênero ao seu final.
“A coligação” é o clima da quinta faixa, denominada “Zumbis do Bem”. Sim, existem os que tentam debelar-se, porém inevitavelmente fecham-se em “clubinhos” iniciáticos; exclusivos etc etc. Na prática, pensam estar ajudando, mas com esse tipo de mentalidade, mais são desagregadores. Uma pena. Na sonoridade, essa canção remeteu-me ao som dos artistas da chamada “Vanguarda Paulista” do início dos anos 1980. Com brasilidade e atitudes jazzísticas proeminentes, a canção traz harmonia com dissonâncias e quebradeira rítmica generalizada, lembrando o som de Itamar Assumpção & Isca de Polícia; Arrigo Barnabé e sobretudo o Grupo Rumo, ainda mais em associando-se a voz de Carol Arantes com Ná Ozetti; Suzana Sales e / ou Vânia Bastos.
O momento é de “reação” e a canção “Antes Só”, mostra a tomada de consciência do personagem, levando-o a fazer crer que o negócio é contar com suas próprias forças. Dura realidade, eu sei, mas se chegamos nesse ponto, o negócio é lembrar do Paulo Vanzolini, isto é : não chore, mas levante; sacuda a poeira, e dê a volta por cima...
Mais uma vez o Klatu recorre à um riff com ritmo todo quebrado, mostrando sofisticação na composição e uma parte mais pesada que lembrou-me o Bachman Turner Overdrive, porque traz o elemento Pop também, marca registrada daquela boa banda canadense.
O personagem, através da voz de Carol Arantes dá o recado quando diz: “ prefiro seguir sozinho do que não me mover”. Muito bom, apesar dos pesares, ainda tem um pingo de humanidade dentro desse combalido zumbi pós moderno.
“O vislumbre” é o sentimento e o nome da canção, “Hora de Acordar”. Aqui, o recado é instrumental e trata-se de um tema versado pelo Jazz-Rock setentista, bem naquela ideia da pegada Rocker x swing da Black Music. Parece música de um disco qualquer do “Return to Forever”, impressiona pela técnica e balanço.
Hora de dar nome aos bois, o grande “Leviatã Pererê” é a canção sob a égide da “repressão”. -“Perseguir sonhos é um desacato a quem quer poder”, diz um verso da letra. Isso mesmo, quem ousa não seguir o padrão imposto, incomoda o sistema. Nessa canção, os ecos de uma MPB hippie dos anos setenta são nítidos. A psicodelia nordestina é representada fortemente e tem um sabor poético dos Secos & Molhados também. Aquele tempo bom onde ligava-se o rádio e havia boa música tocando regularmente...
Um libelo é dado através de “Acorde aos Vivos” e no libreto é a hora da “esperança”. Ufa, então nem tudo está perdido ? O pesadelo da ultra manipulação ainda dá brecha para ser revertido ? Não vivemos integralmente o Big Brother de George Orwell, mas ainda dá tempo de expurgar o BBB da mediocridade televisiva ? Que alívio ! O som é dos mais agradáveis nessa canção, lembrando o Rock’n Roll cockney e cru do Slade, direto e reto no começo da canção. Depois tem interlúdios que lembram o Tutti Frutti dos bons tempos e tal reminiscência boa reforça-se quando ouve-se os backing vocals cheios de “uh uhs” afinados e doces, remetendo aos gêmeos vocalistas, Rubens & Beto Nardo. E por fim, uma dose de sofisticação ao mostrar um looping rumando ao “infinito”, bem ao estilo do Gentle Giant. É belo e grandioso.
Carol Arantes & Leco Peres em click de Andreia Justino
Chegamos ao final da obra e uma surpresa dupla : não tem final feliz, mas espaço aberto para o ouvinte fazer sua análise pessoal a vontade, com o tema “lugar-comum”. O Klatu deixa o recado para que você analise e chegue à sua própria conclusão. O que fazer da sua vida depois de tomar conhecimento dos fatos expostos ? Vai deixar-se levar em ser um zumbi sem face na multidão, ou vai “deszumbizar” ? E a segunda surpresa da canção que chama-se “Vida Modesta e Fecunda’, é que trata-se de um tema instrumental, com característica acústica, usando apenas violão; percussão leve e ruídos silvestres ocasionais. E a voz, apenas onomatopaica, entoa um vocalise numa canção sem letra, apenas transmitindo sentimento, sem mensagens explícitas.
A concepção geral, produção artística e material, ficou a cargo do casal que comanda o Klatu, Leco Peres e Carol Arantes. A produção musical de estúdio sob a supervisão de Daniel Iasbeck. Gravado no estúdio Lab Mancini entre o final de 2014 e 2016, de São Paulo. Canções de Leco Peres (tem uma em parceria com Daniel Iasbeck), e letras de Carol Arantes. Técnico de gravação; mixagem e masterização : Raphael Mancini. Diagramação do encarte : Leandro TG Mendes.
A capa merece uma citação a parte, obra de Adriano Ticiano (criação e lay-out final), mostra uma espécie de robot enferrujado em meio à uma paisagem ultra urbana, deveras rude, e no uso de seu indefectível telefone celular, a grande coleira a favor dos que abduzem-nos. Abertamente inspirado nas obras de Tarsila do Amaral , “Abaporu” (1928) e “Os Operários” (1933), além do britânico Derek Riggs, trata-se de uma bela ilustração e que chama a atenção, sem dúvida. É soturna, mas é perfeita para ilustrar o tema proposto pela banda nesse álbum.
Ouça acima a faixa de abertura do álbum, "Sobrevivendo"
Acima, um "teaser" anunciando o lançamento do álbum do Klatu, "Que Seja Infinito Enquanto Vivo"
Leco Peres mostrou linhas ousadas e com belos timbres de baixo. Carol Arantes na voz e na criação das letras, mostrando muita contundência e crítica ácida, porém bem embasada e firme em suas convicções. Apoiando o Klatu, Daniel Iasbeck além da produção musical, tocou todas as guitarras, violões e teclados. Sua atuação é brilhante, mostrando virtuosismo e muita criatividade nos instrumentos que tocou, além de colaborar também com vocais. Sérgio Marchezoni tocou uma bateria muito precisa em todas as faixas (exceto na última, acústica) e demonstrou muita técnica.
No áudio, o disco mostra-se bem moderno, pela pressão sonora, uso de recursos tecnológicos atuais e timbres.
No cômputo geral, “Que Seja Infinito Enquanto Vivo”, revela-se uma obra coerente com sua proposta; forte enquanto manifesto de uma causa, e muito rica musicalmente, com diversas nuances admiráveis. A banda disponibiliza as suas páginas no Facebook e You Tube, para o leitor obter informações gerais e links para ouvir o trabalho gratuitamente em plataformas musicais como o Spotify, por exemplo.
Nesta semana temos a segunda parte da coluna com o lendário Jack Bruce. Nascido como John Symon Asher Bruce em Bishopbriggs, Escócia no dia 14 de maio de 1943 e falecido em Suffolk, 25 de outubro de 2014 ) é considerado uma das maiores influências no universo do contrabaixo.
Nesta
música do genial Frank Zappa, Bruce utiliza todo o seu vasto
repertório de improvisação. Neste primeiro exemplo temos o “Tema
A” construído com a Pentatônica de E menor.
Apostrophe'
– Solo de Baixo – 0:17
Neste exemplo temos um
magnífico solo de Baixo criado por Bruce. A ideia aqui é modal,
assim como várias músicas de Frank Zappa e a escala utilizada é a
de D mixolídio para o acorde de D e a escala de C Maior para o
acorde de C, obviamente durante todo o trecho o baixista abusa das
“Blue Notes” tão características do Blues.
Drone
– Voz – 0:57
A
fórmula de compasso desta música é inusitada (11/8) e mais uma vez
eu passo a ideia de que é legal gravar a frase ao invés de ficar
contando. A escala utilizada é a Pentatônica Menor dos respectivos
acordes.
Rusty
Lady – Intro
Novamente
a Pentatônica Menor serve como base para a criação da frase.
No
Surrender – Intro
Como
aqui temos um pequeno trecho da música a base está escrita com a
pulsação na metade do tempo, para simplificar as anotações da
transcrição, ela poderia ser indicada com o tempo normal e escrever
“Half-Time Feel” para indicar esta ideia. Para a frase o baixista
explorou basicamente as fundamentais de cada acorde. O grande segredo
está na rítmica do trecho.
Estamos de volta com mais uma coluna "Artigos e Resenhas" aqui no nosso site. Dessa vez o nosso querido amigo e sensacional escritor Luiz Domingues nos fala sobre o primeiro álbum da banda Marcenaria, um grande trabalho que envolve grandes músicos. Vale a pena conhecer o trabalho desta banda apresentada pelo Luiz.
A matéria original pode ser encontrada neste link.
Sou músico e escrevo matérias para diversos Blogs. Aqui neste Blog particular, reúno minha produção geral e divulgo minhas atividades musicais. Como músico, iniciei minha carreira em 1976, tendo tocado em diversas bandas. Atualmente, estou atuando com Os Kurandeiros.
Sem mais, vamos ao texto do Luiz
Marcenaria (1º Álbum) - Por Luiz Domingues
Os tempos atuais são tão desoladores no âmbito cultural em geral no Brasil e no mundo, que chega a causar estupefação que ainda haja artista que empenhe-se em perpetrar obras com substância artística inquestionável e nesse caso, agrega-se um fator a mais a enaltecer-se : a incrível resiliência que demonstra ter, com tal determinação.
É o caso do sexteto “Marcenaria”, que produz um som de extrema complexidade e baseado num caldeirão tão vasto de boas e diferentes influências, que torna o seu trabalho, um verdadeiro exemplo de que ficar nos lamentos pelas redes sociais, em nada ajuda-nos a vencer a guerra contra o baixo astral do show business dominado por gente deliberadamente comprometida com a subcultura, anticultura e afins. O negócio é dar apoio a quem está trabalhando firme, mesmo sem respaldo algum dos grandes meios de comunicação e mesmo assim, mostrando seu valor, que é muito grande, caso dessa banda. Ecléticos e polivalentes, os componentes do Marcenaria são todos multi instrumentistas com extrema destreza nos muitos instrumentos que tocam, cada um, e diga-se de passagem, eles também mantém trabalhos paralelos com outras bandas de carreira (o ótimo “Cosmo Drah”, é um exemplo) e trabalham como side man de artistas importantes.
Neste seu primeiro trabalho fonográfico, o Marcenaria transborda sua musicalidade riquíssima em todas as faixas, fazendo uma amálgama forte entre a urbanidade, e as tradições rurais do Brasil. As músicas interligam-se, sem que no entanto o disco seja assumidamente conceitual ou no formato “ópera”, mas simplesmente a conexão existe e tudo é reforçado pelo apoio de um esmerado trabalho gráfico que mescla o conceito “Comics” ou História em Quadrinhos, melhor dizendo. Não trata-se de nenhuma novidade estética, muitos artistas já usaram desse expediente anteriormente, basta uma rápida consulta aos registros na história do Rock, contudo, não vejo mal algum em reutilizar-se o mesmo recurso e basta usar de criatividade para deixar a marca pessoal, e é o que acontece nesse trabalho, com ilustrações de qualidade e texto amarrado inteligentemente, usando as letras das canções.
Sobre o nível instrumental dos componentes, qualidade das canções e sofisticação dos arranjos, sob esses parâmetros citados, é altíssimo. Não surpreendeu-me em nada, já esperava por isso quando recebi o disco em mãos, e como se não bastasse tal fato, ainda fazem vocalizações em harmonia muito sofisticadas, ou seja, algo muito fora do padrão do que ouve-se no mundo mainstream das emissoras de rádio FM ou na televisão e devo observar, ainda bem ! Os rapazes não estão nem aí para os padrões da música pasteurizada que os marqueteiros determinam que o povo vá ouvir. Maravilha, a preocupação é fazer arte e eles cumprem seu objetivo com galhardia e devo acrescentar, hombridade artística.
Sobre as faixas, são 12 canções muito intensas, apresentando sofisticação musical ímpar, belas harmonias; além de melodias e letras buscando signos do folk brasileiro (entenda isso pelo sentido amplo do termo “Folk”), misturando à urbanidade / modernidade das grandes metrópoles.
Em “Intro”, as convenções com acentos mostram força logo no início. Gostei muito das trocas de ritmos e fórmulas de compasso, mostrando destreza instrumental. A brasilidade evocada é nítida e lembrou-me bastante os bons momentos do “Som Imaginário” de Wagner Tiso & Cia., de outrora. Hermeto Pascoal creio que também encaixar-se-ia como influência. Vocais em harmonia muito bonitos e o som de viola caipira passeando com os sopros intermitentes, são muito ricos. E fora o fato de que frases agressivas executadas por guitarra, baixo e bateria, com instrumentos de sopros cortando tudo em passeios assim, são puro Prog Rock, na tradição de bandas como o "Gong" e "Van Der Graaf Generator", entre outras que usavam tal prerrogativa, certamente
A faixa seguinte, “Meio Tom Acima do Chão” tem muita inspiração na dita psicodelia nordestina dos anos setenta. Não obstante o fato de evocar Lula Cortes, tem elementos sofisticados que muito lembram o Jazz fusion brasuca de Egberto Gismonti, pleno de brasilidades e virtuosismo. As intervenções de sopros são belas ao extremo, garantindo um colorido ininterrupto, como se uma revoada monumental de pássaros coloridos passasse pela janela enquanto ouvimos a faixa. Gostei muito de um solo de guitarra ao estilo “backwards” que é executado sobre uma batida tribal e linha de baixo num “looping” meio caribenho. E o parte final vai para a quebradeira total (ótimo !). Chamou-me a atenção um trecho da letra :
“Lei de Newton, debaixo da castanheira, um banzeiro na minha cabeça...
as vezes pareço andar meio tom acima do chão”...
Acho que uma imagem assim espelha bem a proposta da banda em buscar a poética das raízes, sob o viés da amálgama urbana.
Em “Guarânia”, trata-se de fato de desse gênero musical sulamericano / paraguaio / guarany, mas claro, sob uma sofisticação instrumental que a faz mais parecer uma música do "Jethro Tull", tamanha a profusão de detalhes e pegada Progger Rock. Gostei muito do solo de flauta, executado por Claudia Rivera, uma instrumentista convidada especial da banda. E a letra / linha melódica e também interpretação, eu diria, tem uma lembrança forte do trabalho do Zé Rodrix, a meu ver, bem daqueles discos solo dele dos anos setenta, que se o leitor nunca ouviu, conclamo-o a procurá-los no You Tube. É aquele toque de urbanidade que o saudoso Rodrix tão bem sabia dar no seu recado e o Marcenaria parece ter recuperado, ainda bem.
A faixa “Vire o Disco !” tem na sua proposta uma crítica ácida, mas muito pertinente à inércia da atual juventude. Todo mundo com olhos e dedinhos que não desgrudam dos celulares, mas de conteúdo bom que tal interação sócio tecnológica poder-se-ia resultar, nada, absolutamente nada !! E nesse deserto de ideias, chega a ser indecente termos tanta tecnologia disponível para que a imensa maioria fique hipnotizada por futilidades múltiplas. Portanto, a metáfora proposta pela letra é muito boa, ao utilizar a imagem do velho disco de vinil e sua inevitável necessidade gerada de obrigar o ouvinte a vira-lo na pick up, a cada término de lado executado.
“É hora de virar o disco, esse lado já se acabou.
Levante o corpo do sofá e o braço da vitrola”.
Muito boa a mensagem, faça alguma coisa edificante, senhor "abduzido" das redes sociais...
Musicalmente, essa faixa fez lembrar-me bastante o som da banda Prog Rock brasileira dos anos setenta, “Terreno Baldio”, pela mescla de virtuosismo instrumental "Progger", com brasilidades. Sopros e violas caipiras passeiam o tempo todo.
A faixa seguinte, “O Trem” tem um sabor Blues, todavia pelo viés de um “quase” reggae. A proposta da letra lembrou-me o Zé Ramalho de seus mais inspirados trabalhos e um solo de guitarra, de arrepiar, trouxe o elemento Rock com muita força.
“Bruxismo”, tem fortes elementos do Jazz-Fusion, lembrando-me inicialmente o trabalho do “Weather Report”, mas como a pegada dos rapazes é de Rockers, acredito que soe mais Jazz-Rock, algo na linha do “Soft Machine”. Admirável a quebradeira ao longo das mudanças bruscas no tema. Tem algo de experimental bem na tradição dos compositores malditos da MPB setentista, bem naquela predisposição nonsense de artistas como Tom Zé; Jards Macalé & Walter Franco, com direito a intervenções de vozes e risadas. Muito bom, meninos, sabemos desde os anos setenta que loucura pouca é bobagem.
“Teste de Viola” é um tema instrumental e parece que o “Captain Beyond” foi tocar com violeiros caipiras, tamanho o peso Hard-Rock (em alguns trechos) e uma tremenda performance da viola. Um longo interlúdio, pleno de climas dá espaço para os solos.
“Fusa Roceira” tem uma base harmônica bastante sofisticada, com ótimos vocais em harmonia, percussão criativa e lembrou-me bastante os primeiros trabalhos do Alceu Valença, quando este era menos “pop” e mais instigante como artista, eu diria. As intervenções de guitarra ao final, lembraram-me o som cerebral de Robert Fripp e gostei muito do final épico, que despertou-me a lembrança da sofisticação do “Wishbone Ash”. Bacana o piano, incluso.
“Pessoas de alumínio e cobre, presas de jacaré e pedra.
Só para descobrir.
Mais um ponto do encerado pra eu arrochar.
Mais um ponto do mistério pra eu descobrir”...
Uma letra que deixa bem clara a dicotomia da visão da vida moderna, pelo viés da sabedoria caipira. A pensar-se...
A canção “Chuva”, traz efeitos muito interessantes no seu início. Gostei da onomatopeia que fez-me recordar de uma linhagem melódica da MPB, que simplesmente não existe mais e até meados dos anos 1960, era ouvida em profusão no rádio e na TV. Gostei bastante da linha de bateria e baixo, com um sentido de preenchimento de espaços muito criativo. Fora as múltiplas convenções super técnicas. Tem climas jazzísticos acentuados, igualmente.
Na canção “Rinha de Galo”, a proposta é aparentemente mais regional, com acordeon, mas o Marcenaria não abre mão de seu esmero instrumental e logo entram elementos experimentais diversos. Gostei muito de uma desdobrada proeminente, e logo a seguir, um solo de guitarra ultra anos sessenta, que dá a impressão que Randy California ou Jorma Kaukonen foram trazidos por uma máquina do tempo, direto do palco do Fillmore West, de San Francisco em 1968, para o estúdio. Muito legal. Ótimas as convenções finais e com o belo solo de sax, dobrado.
Na faixa seguinte, “Camping de Noel”, é muito clara a semelhança com os trabalhos mais experimentais / psicodélicos dos primeiros discos dos Mutantes, com direito à robustez dos arranjos do maestro, Rogério Duprat. Mais uma vez, as vozes fazem um belo trabalho em harmonia.
A última canção do álbum tem um título conclusivo : ...”Mas no Final”..., uma ideia interessante, sem dúvida em dar ao ouvinte, um norte do que pretendem, com a obra. Na letra, fala-se :
“Olhou para si, olhou para o céu.
E se pôs a lembrar tudo o que aconteceu quando então saiu de si em sua Marcenaria”...
Muito bacana dar essa opção para que o ouvinte faça de sua auto reflexão um mergulho, cada qual em sua “marcenaria”, ou seja, sua própria vida. Pela metáfora da oficina e das ferramentas todas à disposição para a livre manipulação e criação de seu caminho / obra / vida.
Sobre a sonoridade dessa canção, soa como um baião bastante sofisticado e com elementos no arranjo que muito recordou-me o som do “Ave Sangria”, uma banda nordestina dos anos setenta, infelizmente pouco citada, mas muito relevante. O final da canção tem mais uma vez um sabor “Van Der Graaf Generator”, muito bonito, a meu ver.
O Marcenaria é formado por Anderson Ziemmer (voz; guitarra; clarinete e percussão); Augusto Miranda (voz; guitarra; viola caipira; violão e flauta transversal); Bruno Costa (sax soprano e tenor); David Forell (voz e bateria); Elton Amorim (baixo; violão; acordeon; piano e viola caipira); Paulo Costa (voz; clarinete baixo; clarinete soprano; sax tenor e percussão).
Além da versatilidade da banda, ainda convidaram músicos para colaborar, casos de Claudia Rivera (Flauta Transversal); Clara Andrade (percussão) e Renato Amorim (guitarra).
Gravado no estúdio X, com Giorgio Karatchuk na operação do áudio; Thiago Nacif na mixagem e André Ferraz na masterização. Criação e lay out final de capa e encarte por Augusto Mendonça. Produção executiva por Marcelo Spindola Bacha. Selo : Melômano / Rock Company.
No cômputo geral, trata-se de um álbum com excelente áudio; é moderno, com pressão e definição, mas apresentando timbres bastante próximos de uma sonoridade mais “vintage” (viva !!). A qualidade musical da banda impressiona muito, tanto no nível instrumental quanto vocal, além da elaboração de arranjos sofisticados e letras com poética muito além da pasmaceira pasteurizada da música mainstream dos tempos atuais de 2017.
Contato direto com a banda, via E-mail :
marcenaria@gmail.com
O Site oficial da banda :
https://www.bandamarcenaria.com
Eis abaixo, o álbum na íntegra para o leitor conhecer esse trabalho :
É isso pessoal! Espero que vocês curtam esta incrível banda indicada e resenhada pelo meu amigo Luiz Domingues. O grande "barato" de fazer esta coluna é conhecer bandas como a Marcenaria. Abraços e até a próxima coluna!
Estamos de volta com mais uma coluna Artigos e Resenhas aqui no nosso site. Dessa vez o sensacional Luiz Domingues nos fala sobre o álbum do baixista Pepe Bueno "Eu, o estranho". Vale a pena conhecer o trabalho deste inquieto músico apresentado pelo Luiz.
A matéria original pode ser encontrada neste link.
Sou músico e escrevo matérias para diversos Blogs. Aqui neste Blog particular, reúno minha produção geral e divulgo minhas atividades musicais. Como músico, iniciei minha carreira em 1976, tendo tocado em diversas bandas. Atualmente, estou atuando com Os Kurandeiros.
Sem mais, vamos ao texto do Luiz
Eu, o Estranho / Pepe Bueno - Por Luiz Domingues
Pepe Bueno, é baixista de uma banda de Rock chamada, Tomada, que já conta com uma carreira longeva na cena Rocker paulistana. Super ativo como músico; produtor musical e envolvido também com audiovisuais, é irrequieto por natureza e não obstante o fato de batalhar arduamente por sua banda, encontra fôlego para trabalhos musicais paralelos em regime solo. Em 2008, lançou seu primeiro álbum solo, “Nariz de Porco não é Tomada”, numa clara alusão em tom de brincadeira com o nome de sua própria banda. E nesse trabalho, já surpreendeu positivamente ao fugir do clichê de que disco solo de baixista tem que ser inteiramente instrumental e calcado em Jazz-Fusion, recheado de solos de baixo. Pelo contrário, tratou-se de um disco repleto de canções com teor Rock e apelo pop convidativo.
Agora (2016), lança um novo trabalho solo e surpreende mais uma vez, ao trazer elementos os mais diversos, ainda que a formatação seja a de um conjunto de canções curtas, algumas com potencial radiofônico, até. Não obstante o que citei acima sobre o caráter pop de algumas canções, seu novo álbum investe bastante em psicodelia; experimentalismos e loucuras em geral, lembrando os primeiros álbuns dos Mutantes em muitos aspectos.
Com muita qualidade nas composições e arranjos, o álbum prima também pelo alto padrão instrumental, pois Bueno cercou-se de ótimos músicos a acompanhá-lo como banda base, além de alguns convidados pontuais e sensacionais. Contando com Alberto Sabella (teclados, guitarras) e Junior Muelas (bateria e percussão), componentes da excelente banda “A Estação da Luz”, como seu núcleo base, Bueno também contou com quatro guitarristas da pesada (Denny Caldeira; Xande Saraiva-Baranga-; Edu Gomes e Pi Malandrino); as cantoras Renata Ortunho (também componente da Estação da Luz), e Débora Camiotto; além do vocalista Fernando Fish (ex-componente da Estação da Luz).
Com um time desses, tendo boas composições nas mãos e arranjos criativos na cabeça, não tinha como dar errado, e de fato, não deu outra mesmo, tratando-se de um excelente álbum.
A primeira faixa se chama “Se Abra” e cabe uma explicação em relação ao seu título, visto ter uma segunda intenção em tom de homenagem prestada. Além da ideia de “se abrir ao som” como sugere inicialmente o título, foi também a maneira pela qual Pepe Bueno homenageou o saudoso baixista, Renê Seabra (Se Abra...), que era muito amigo dele e de quase todo mundo no meio Rocker de São Paulo, incluso este que vos escreve. Tema instrumental, passeia pelo Jazz-Rock setentista com intenções funkeadas, mostrando muita versatilidade musical. Apresentando uma introdução que lembra bastante o trabalho de Frank Zappa, tem uma linha de baixo intrincada, com intervenções muito ricas da guitarra e sobretudo pelos teclados pilotados por Alberto Sabella, que usou seu arsenal setentista sensacional, de forma soberba. Tem clavinete swingado; um piano muito Chick Corea; órgão Hammond esquizofrênico a La Ken Hensley, e um solo de baixo muito louco para derreter os miolos do ouvinte. Aliás, para introduzir a entrada do referido solo, uma frase emblemática (e engraçada), que era um bordão criado e usado pelo grande Renê, é pronunciada : -“Hey, Bro, liga o phodalizer”, uma pilhéria que sempre arrancou risadas de quem o ouvia falar isso. É de fato, a única intervenção vocal da faixa, que é instrumental. Junior Muelas, que é um dos meus bateristas prediletos na cena Rocker brasuca moderna, é tão seguro e preciso, quanto esperamos dele, e ainda colocou uma intervenção de percussão com cowbell e reco-reco, estratégica, trazendo um molho todo especial em alguns trechos. E lá vamos nós de encontro à segunda faixa, chamada “Rotina”, com uma deliciosa pegada, ao melhor estilo das influências sessentistas que buscavam inspiração nos anos trinta do século passado. É folk; bucólico; silvestre, lembra Donovan, Beatles, e tem seu sabor de Rock Rural, como se estivéssemos no interior de Minas ouvindo um disco do Sá; Rodrix & Guarabyra, numa casa no campo. Gosto muito da docilidade do Mellotron a la Beatles, desenhando junto com a voz principal e os backing vocais. É bem divertida também a intervenção do baixo de Bueno, usando um recurso bem exagerado (Synth Bass, na verdade), numa condução típica de música Folk, realçando-a. Muito bacana o órgão Hammond "limpo", sem caixa Leslie, ao estilo “igreja”, que aparece vez por outra. Tem muitos detalhes de cordas, incluso um lap steel (executado pelo próprio Bueno, que aliás, pilotou vários violões e guitarras no disco todo), bem caipira e bem legal, é claro... Letra muito hippie, gosto dessa suposta ingenuidade perdida, mas que suplanta em muito a insistência de letristas pessimistas ao pintar o mundo de cinza.
“Deixe o sol entrar na sala, abra a porta ou deixe um vão;
raio de luz mostra a vida, mais simples que a escuridão”...
Fecho com o “mahatma” Harrison nessa questão de deixar o sol entrar, sempre...portanto, vai é que sua Pepe Bueno !
“Vale Dizer” é outra canção “beatle” (mas tem um quê de Small Faces nas entrelinhas, também), de pegada mezzo folk, mas a despeito de numa primeira impressão que tive, a opção por ter ficado logo a seguir da anterior ter sido errada, pela quase similaridade estilística, ao ouvi-la com atenção, minha impressão dissipou-se por completo. Muitos elementos da teia beatle de sonhos lúdicos estão ali representadas. Solo de cravo trazendo o elemento erudito via George Martin; Melloton doce a la "Strawberry Fields"; trechos em staccato; órgão Hammond; baixo de timbre grave e aveludado marcando tônica e quinta, ou quarta abaixo; e guitarras pesadas a realçar partes mais dramáticas. Lembrou-me também muitas canções da carreira solo do Ringo Starr, sempre alimentada pela cordialidade e genialidade de seus amigos...
A quarta faixa se chama “Bem à Vista”. Apostando no ritmo 6/8, tem uma condução de baixo e bateria muito envolvente. Os teclados brilham muito; o órgão Hammond lembra muito bandas de Hard Rock setentistas como o Uriah Heep; Jane; Lucifer’s Friend e outras, com peso e saturação. Gosto da parte B, muito dramática, num crescente harmônico. É melancólica a melodia, principalmente pelo fato de ser realçada pela letra poética (“A escuridão vai chegar/E eu não vou me preocupar/Em acender a luz e sim em esperar/O dia amanhã ser e o sol/Chega cedo e brilha forte/Pedindo o seu espaço”). Lembrou-me pela intensidade, a cadência de “1921”, do disco Tommy, do The Who. Os backing vocals são sensacionais, com um desenho de notas esticadas em mínimas e semínimas, lembrando muito o trabalho vocal dos irmãos Nardo, nos bons tempos de Rita Lee & Tutti Frutti.
“Última Prova” tem um baixo com timbre sensacional, e riff ganchudo que lembra bastante os trabalhos solos de George Harrison. Muelas e Sabella brilham muito. Gostei bastante da base de guitarra, também, com uma densidade rara, mas sem cair na tentação dos timbres modernosos e crunchados de bandas de orientação pesada, pelo contrário, bem vintage (e por isso agradou-me, é claro, ha ha ha...). “Tudo o que queria” é a sexta faixa do disco e investe no country Rock. O timbre do órgão Hammond e do piano são puro The Band. É como se Richard Manuel e Garth Hudson tivessem-na gravada, mas certamente que jogaram suas bênçãos sobre Alberto Sabella. Tem ótimo refrão e apoio da guitarra nessa canção.
“Pote de Mal” é um tremendo Blues-Rock em 6/8, com influências as mais nobres, passeando entre o Humble Pie; Mountain, Ten Years After; Robin Trower; Rory Gallagher etc etc. Muito bacana o vibrato da guitarra em alguns trechos. Curti toda a loucura experimental a La Whole Lotta Love, do Led Zeppelin, no meio da canção, e o solo de guitarra é de arrepiar.
Por fim, a última faixa é emblemática ao bojo da obra toda. Justificando a temática que evoca a estranheza psicodélica, na canção “O Estranho”, Pepe Bueno chuta o pau da barraca e aposta as suas fichas na rodada final do seu carteado, com muito experimentalismo; estranheza & psicodelia. Lembra muito o trabalho de bandas como o Gong; Can; Mutantes nos seus primeiros tempos; trabalhos solo de Syd Barrett, e com a intervenção vocal de Débora Camiotto numa locução anárquica, traz a lembrança do trabalho de Arrigo Barnabé. Completamente louca, é uma faixa instigante que fecha bem o álbum e justifica seu título, como uma ode à loucura. O disco foi gravado em dois estúdios. Parte no Área 13, de São José do Rio Preto / SP, estúdio de Alberto Sabella que pilotou a gravação, e parte no Cakewalking, de São Paulo, do não menos ótimo, Edu Gomes, que também fez a pilotagem dos botões. O áudio ficou muito bom, moderno com "level" alto, embora em alguns momentos eu tenha achado que a voz solo de Pepe Bueno tenha ficado numa briga com o instrumental. Vejam, sou um Rocker inveterado e detesto o conceito pop / comercial de se colocar a voz solo muito acima do instrumental, e pelo contrário, cresci ouvindo discos de bandas de Rock clássicas com conceito oposto, de vozes quase no mesmo patamar dos instrumentos. Mas senti em alguns trechos uma certa dificuldade na inteligibilidade das letras. Claro, pode ter sido proposital para realçar a estranheza proposta na obra, conceitualmente portanto. Sobre a capa, cabe um parênteses. Assinada por Fábio Mata (que também assinou a capa do CD debut da Estação da Luz), é um dos melhores trabalhos dos últimos tempos, numa colagem muito criativa. Fazendo jus ao mote geral da obra, trabalha a ideia da estranheza expressa através de conceito surrealista, apresentando uma ilustração emoldurada como um quadro de exposição, mostrando a perturbadora figura de dois homens numa mesa de restaurante, mas sob a égide do surreal. Ambos trajados à moda dos anos quarenta, causa estranheza o rosto de um deles fatiado em camadas como a insinuar a metáfora das subpersonalidades descoladas, e o outro, com cabeça de elefante (insinuando o panteão hinduísta talvez, seria Ganesh ?), deixando derramar um copo de leite, que se espalha pela tela. Fora os detalhes (cogumelos no drink; a capa do primeiro álbum do Pepe Bueno sobre a mesa etc). Conclusão : é estranhamente belo... A mixagem do disco foi feita por Alberto Sabella e o próprio Pepe Bueno, com masterização a cargo de Daniel “Lanchinho”, em São Paulo. Foto por Victor Daguano.
Assinam a produção geral, junto a Pepe Bueno, Alberto Sabella e Junior Muelas.
O disco não foi lançado em versão física, no CD tradicional e Bueno justifica que tal iniciativa nos dias atuais com o CD em decadência, não faz sentindo mais. Penso igual, registre-se. Não descarta no entanto, que no futuro haja um lançamento na versão em vinil, o velho LP. Como o mercado é volátil (e estratégico enquanto capitalista), quem nos garante que o CD não tenha um revival mais para frente, também ? Registre-se, também.
Por enquanto, o negócio é ouvir a versão que o disco tem em plataformas como o Spotify e Deezer, por exemplo.
Bueno já produziu e lançou um vídeo-clip, louquíssimo por sinal, da música “O Estranho”, disponível no You Tube e Vevo. Promete lançar um para cada canção, nos próximos meses. Eis o clip de "O Estranho" :
Veja também o clip do Making off da gravação do álbum "Eu, o Estranho" :
Para conhecer melhor esse trabalho, procure informações na página de Marcelo “Pepe” Bueno no Facebook : https://www.facebook.com/PepeBuenoRock O disco na íntegra, no Spotify :
Contato direto com Pepe Bueno :
peperockista@gmail.com
Eis aí mais um trabalho que eu recomendo, certamente !